DE LÁGRIMAS E ÓDIOS
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É tão fácil odiar, tão agradável e mais,
tão formativo, que devíamos todos,
portugueses, odiar melhor. O sô presidente,
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que por tudo se comove, devia dar o exemplo,
e em vez de lacrimar pelo dente cariado
no sorriso do mastim, pela página rasgada,
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pelo fogo na cabeça do pedinte,
melhor faria em odiar, de todo o coração,
essa página, esse fogo e esse dente. Talvez
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assim chegasse um dia ao fundamento
de haver dentes abalados, páginas tolhidas,
ou fogos indecentes. Mas os olhos nacionais,
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que transtorno lhes faria a obrigação de ver
sem lágrimas, quando é tão bom chorar,
tão acessível, e mais – tão performativo
(Agosto de 2005)
Boa noite.
Que falta faz – ao mundo, a todos nós – os poemas de José Miguel Silva… É outra linguagem, em palavras que nos preenchem o cérebro. Aqueles 300 cérebros, mais coisa menos coisa, como dizia o Rui Pires Cabral.
Faz tanta falta como uma pedra no sapato, um alicate à sobremesa ou uma ventoinha no cadafalso.