Sou um homem com alguma idade. A natureza das minhas ocupações nos últimos trinta anos levou-me a contactar de perto com o que julgo ser uma classe profissional bastante interessante e algo singular, mas sobre a qual nunca ninguém escreveu nada, tanto quanto sei – refiro-me aos copistas ou escrivães. Conheci um grande número deles, tanto profissionalmente como a título particular, e se quisesse podia relatar a seu respeito várias histórias, que fariam talvez sorrir as pessoas benevolentes e chorar as de natureza mais sentimental. Mas trocarei a narração das biografias de todos esses escrivães por algumas passagens da vida de Bartleby, que foi o escrivão mais estranho que alguma vez vi ou de que ouvi falar. Se de outros copistas eu podia escrever a história completa, em relação a Bartleby é-me impossível fazer o mesmo. Estou em crer que não existe material para que se possa escrever uma biografia integral e satisfatória desse homem. O que é uma perda irreparável para a literatura. Bartleby era uma daquelas pessoas sobre as quais nada se pode apurar a não ser recorrendo às fontes originais, e no seu caso estas são bastante escassas. Com a excepção de um vago rumor que mencionarei mais adiante, tudo o que sei de Bartleby é aquilo que os meus olhos estupefactos testemunharam.
Herman Melville, Bartleby, o Escrivão (Tradução de José Miguel Silva)
tem boa pinta sim senhor